José
Márcio Soares Leite, AMM, SMHM, IHGM.
Em artigo publicado na Folha de São Paulo, de 30 de dezembro de 2012, sob o
título “Não pode ser crime salvar uma vida”, a advogada criminalista e professora
livre-docente de direito penal da Universidade de São Paulo (USP), Janaina
Conceição Paschoal, nos diz que “ganha força, na bioética, o princípio da
autonomia individual, segundo o qual o paciente deixa de ser visto como alguém
subordinado ao médico”. A relação médico-paciente, hoje vertical, passa a ser
horizontal, ou seja, o paciente passa a ter opinião na conduta médica a ser
definida para o seu caso clínico ou cirúrgico. E prossegue: “não obstante, por
mais que tal autonomia do paciente seja importante, não parece razoável
tutelá-la por meio do direito penal”, para concluir que “Atualmente, por força
do previsto no artigo 146 do Código Penal, o médico que salva a vida de um
paciente sem o seu consentimento não pode ser acusado de prática de constrangimento
ilegal. No entanto, se o projeto de lei 236/12 for aprovado no Congresso
Nacional, essa situação se modificará, pois o artigo 145 dispõe que somente se
afasta o crime de constrangimento se o paciente for incapaz ou se não puder
manifestar seu consentimento para o ato médico a ser praticado, mesmo que esse
ato seja para salvar sua vida”.
O artigo da Professora Janaina nos remete a uma reflexão, sobre uma terceira
via do exercício do ato médico, ou seja, quando o paciente, com ou sem opção
manifesta, deixa de receber o tratamento adequado, por absoluta falta de
condições materiais do serviço de saúde em que esteja sendo atendido, o que se
denomina mistanásia.
Como agravante dessa situação, a pesquisa sobre o perfil
das vítimas de violências e acidentes atendidas em serviços de urgência e
emergência selecionados em 74 estabelecimentos no Distrito Federal e 23
capitais brasileiras/2009, trabalho das pesquisadoras Silvânia Suely
Caribé de Araújo Andrade; Naíza Nayla Bandeira de Sá; Mércia Gomes Oliveira de
Carvalho; Cheila Marina Lima; Marta Maria Alves da Silva; Otaliba Libânio
Moraes Neto; Deborah Carvalho Malta (Departamento de Análise de Situação
de Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde, Brasília-DF e
das Universidades Federais de Goiás e de Minas Gerais), concluiu que 89,9%
dos atendimentos dos serviços ditos de urgência e emergência, decorreram de
acidentes e violências, em indivíduos do sexo masculino, a maioria na faixa
etária de 20 a
29 anos, com baixa escolaridade, situações relacionadas ao consumo de álcool e
como locais de ocorrência a residência e a via pública. Situações que exigem
uma rápida intervenção da equipe de plantão nesses serviços de saúde, para
salvar a vida do paciente e/ou impedir o agravamento das lesões.
O problema existe, é grave e constitui o maior desafio dos novos prefeitos
que ora assumem um primeiro mandato ou que foram reeleitos, pois não esqueçamos
ser a saúde o espelho da sociedade, refletindo a quantas anda a administração
pública, não somente no que pertine intrisicamente ao processo saúde-doença,
mas a governança e a performance das políticas públicas no âmbito municipal,
pois não se trata mais de um direito à vida, mas do direito à vida com
saúde.
Daí a necessidade dos prefeitos ora empossados, desenvolverem pelo menos um
perfil mínino de atenção integral à saúde, que incluí: vigilância em saúde,
controle de endemias, das doenças sexualmente transmissíveis, imunização,
atenção à saúde materno-infantil, atenção à saúde dos idosos, incluindo
programa de reabilitação, serviço de pronto atendimento (SPA 24 horas e sala de
reabilitação e leitos de observação) e centro de parto normal, serviços esses
que devem estar integrados e articulados regionalmente com outros serviços de
maior complexidade, por meio de centrais loco-regionais de regulação.
Para o desenvolvimento desse perfil mínimo em saúde, contudo, é
necessário que os novos prefeitos eleitos no Maranhão, por meio de seus
secretários de saúde, lutem na Comissão Intergestores Bipartite do Maranhão
(CIB/MA) pela equidade na divisão dos recursos do Sistema Único de Saúde (SUS)
no estado, e que garantam o cumprimento da Emenda Constitucional 141/12,
que os obriga a gastarem 15% de sua receita líquida em saúde. Esse é o único
caminho que pretendem, como espero, salvar vidas.
*Professor Doutor em Ciências da Saúde;
Subsecretário de Estado da Saúde; Presidente das Academias Maranhense de
Medicina e Pinheirense de Letras, Artes e Ciências, Membro do I.H.G.M e da
A.M.C.
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