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segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

O SUS E SEU CALCANHAR DE AQUILES


 ALDIR PENHA COSTA FERREIRA*

Chegam-nos através da imprensa, quase diariamente, notícias sobre o precário estado das instalações - e o mau funcionamento - de alguns serviços públicos de saúde. Superlotação de pacientes, deficiência de pessoal e material e assim por diante.
Isso, porém, era previsível. Uma análise superficial apenas confirma. Acontece que o SUS (Sistema Único de Saúde), embora muito bem elaborado, dir-se-ia perfeito no papel, não foi, não é e dificilmente será levado ao terreno da prática tal como planejado. Perdoem-me os idealistas, mas não houve, não há e talvez nunca haja a necessária lisura na aplicação prática dos princípios administrativos e dos recursos financeiros preconizados. A municipalização – alguns chamam, jocosamente, prefeiturização - da saúde não atingiu, não atinge e dificilmente atingirá os seus objetivos. A explicação é simples: enquanto predominar esse temperamento bem brasileiro de usufruir vantagens pessoais – e político-partidárias – à custa do processo, a Lei 8.080/90 e outras jamais serão cumpridas à risca.
Sabe-se que o Dr. Adib Jatene preferiu deixar de ser Ministro da Saúde porque descobriu que os recursos do SUS estavam sendo canalizados para fins diferentes dos da sua pasta. Além disso, em muitos municípios do Maranhão - e com certeza de outros Estados - os proprietários de hospitais que não se afinaram com os propósitos políticos dos prefeitos foram punidos com a restrição – e até suspensão - do fornecimento de AIHs. O resultado foi que a maioria fechou as suas portas. E as prefeituras, senhoras de rédeas e verbas, não tiveram e ainda não têm condição de cumprir outra determinação da lei citada: prioridade, com eficiência e eficácia, dos serviços públicos de saúde. Não estão conseguindo, como se diz na gíria, “descascar o pepino”. A consequência, como diria o ex-governador Jackson Lago, é essa procissão de ambulâncias no rumo de São Luís, onde as condições de controle de verbas – e de execução de serviços – vêm sendo, na medida do possível, cumpridas.
A prática dos serviços de saúde é uma atividade cara. Tem que ser metodicamente planejada e executada, não só em termos de controle de gastos, mas também de adequação de pessoal, disponibilização de recursos materiais, acompanhamento da evolução científica e tecnológica, e muito mais.
Os serviços públicos de saúde de São Luís, por maior que seja o empenho de seus dirigentes, não têm condição de assumir a carga de outros municípios, porque também aqui existem enormes dificuldades. Só para exemplificar, num conhecido serviço da banda de cá os médicos mandam comprar, pagando do próprio bolso, pausinhos de picolé para usarem como abaixadores de língua.
Saúde e muito mais que levantar edifícios e pôr vistosos letreiros em paredes e ambulâncias. É higiene pessoal, é morada digna, é saneamento básico, é água potável, é salário, é educação... Saúde é seriedade de propósitos.
Prática difícil? É. Não é fácil. E por não ser fácil, a sua execução demanda esforço, dedicação, profissionalismo, decisão política e principalmente isenção das influências estranhas ao processo.
Esse o calcanhar de aquiles do Sistema Único de Saúde. Vítima, em muitos locais, dos desencontros de interesses, as verbas muitas vezes são canalizadas para outros fins, e a consequência é essa que se vê. Plagiando a idéia do poeta, “é necessário isentar serviços de saúde dos interesses estranhos”

* Médico, ex-professor da UFMA, membro da Academia Maranhense de Medicina e da Sociedade Maranhense de História da Medicina.


   

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